quarta-feira, 27 de maio de 2009

A vida se inicia no último suspiro


Amanheceu cinza naquele dia. Talvez um dia como outro qualquer, ou somente pensava que assim seria. Para minha surpresa eu estava atrsado quando levantei-me. Quarenta e um anos de vida e excepcionalmente neste dia acordo atrasado para o trabalho. Terei que pular o café-da-manhã. Tudo bem, não me importo.

Após me arrumar, entro no meu carro e giro a chave na ignição. Talvez se dirigir um pouco mais rápido é possível que faça o percurso em vinte minutos, talvez quinze. Piso na embreagem e engato a marcha. Quando piso no acelerador um som grotesco sai da boca do motor. Vejo fumaça saindo de debaixo do capô. Excepcionalmente neste dia o carro resolver quebrar. Tenho que começar a pensar em comprar um novo.

O percurso que faria em vinte minutos agora será feito em quarenta. Talvez trinta. Começo a andar em direção ao trabalho. Vou observando meu bairro a medida que caminho e noto elementos que antes não dava importância. Não me lembrava das ruas terem todas essas árvores e nem da presença daquela escola. Vejo as crianças entrarem na escola. Ao fixar os olhos em um garoto se despedindo do seu pai, uma enxurrada de lembranças vem à tona. Como seria minha rotina caso ainda fizessem parte da minha vida, eu penso.

A exatamente dez anos atrás, exatamente hoje. Lembro-me que estava em reunião no trabalho quando sou chamado para atender uma ligação urgente. Meu filho iria nascer. Meu sonho de construir uma família estava sendo realizado naquele instante. Quando cheguei no hospital descobri que a situação era um pouco mais séria do que o normal. Minha mulher estava sofrendo de uma hemorragia interna por causa do parto e meu filho por algum motivo estava sendo sufocado pelo próprio cordão umbilical. Segurava a mão de minha mulher rezando para que Deus não tirasse de mim os elemento mais importantes da minha vida. Ela estava olhando nos meus olhos quando se foi. Junto de meu filho, que nasceu sem vida, ela me deixou só.

As lembranças de meu passado fazem com que lágrimas escorram pelo meu rosto. Pego um lenço no bolso interno do meu paletó e as enxugo. Volto a focar no meu caminho, já estou perto. Paro no final da quadra e olho para os lados da rua para poder atravessar. Não havia sequer um carro ou pessoa nas adjacências. Por um instante sinto uma leveza no coração, me senti calmo como nunca fiquei antes. Começo a caminhar indo em direção ao outro lado da rua. Agora senti o cheiro perfumado da minha mulher no ar. Repentinamente, o único cheiro que sentia era o de meu próprio sangue que encharcava o asfalto.

Aparentemente eu havia sido atropelado enquanto atravessava a rua. Na hora eu penso que não haviam carros na rua. Mesmo assim lá estava eu, estirado no chão, atropelado por um carro. A última visão que tenho são de pessoas, várias delas, tentando me socorrer. A primeira visão que tenho é a minha mulher e meu filho esperando por mim. Eles me chamam e na direção deles eu vou. Um ar de graça é o tranquilidade é o último sentimento que deixo. Um sorriso é meu último gesto. Deus me deu de volta meu maior sonho. Talvez eu não quisesse enxergar o carro.

Pedro Lobato

1 comentários:

Guilherme Toscano on 27 de maio de 2009 às 16:58 disse...

Emo.

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